A microempresa enquanto trabalho: o motorista da Uber

15 de Outubro de 2018
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Uber

Em julho de 2014, a Uber iniciava a sua atividade em Lisboa, expandindo-se em poucos meses a outras cidades portuguesas. Embora se concentrasse no serviço de transportes de passageiros, a empresa recusava tal categorização, assumindo-se como uma plataforma tecnológica que assegura o contacto entre motoristas e clientes. De facto, pouco tempo depois, a Uber alargaria a sua esfera de negócio, passando a incluir a entrega de produtos de restauração ao domicílio. Ambas as áreas, entretanto, passaram a contar com a concorrência de outras empresas, como a Cabify e a Taxify no primeiro caso, ou a Glovo e a Deliveroo, no segundo.

À exceção de algumas (poucas) reportagens e artigos de impresa 1, a crítica à atividade desempenhada pela Uber e organizações análogas tende a focar-se na violação das leis da concorrência, cerne do conflito com a Associação Nacional de Transportes Rodoviários em Automóveis Ligeiros (Antral). A situação das pessoas que prestam serviços de transporte de passageiros a partir da aplicação da Uber acaba assim por ser alvo de alguma indiferença, contribuindo para o desconhecimento da sua condição. Esta é frequentemente encarada como expressão de uma economia de partilha, conceito que remete para uma ideia de encontro e de compatibilidade entre diferentes interesses: o do cliente, o do prestador do serviço e o da plataforma que os coloca em contacto. O objetivo deste artigo é colocar em causa este pressuposto, analisando-se os termos desta relação a partir de duas experiências de trabalho com a Uber, uma já concluída, a outra ainda em decurso.

Uma questão de urgência

André [nome fictício] foi trabalhar para a Uber a partir de um contacto de um amigo. À primeira vista, a formação na área da produção de espetáculos não adivinhava este destino. Porém, a dupla condição de pai e de inquilino conduziu a que, face ao desemprego, existisse uma «urgência de começar a entrar dinheiro e a Uber foi a solução mais imediata». Não se recorda do nome da empresa parceira, o que é indicativo de como nesta relação os papéis de mediação entre prestador e cliente se multiplicam: «O nome da empresa tu acabas apenas por só ver no recibo. É como se trabalhasses para a Uber quando na verdade trabalhas para aquela empresa». Para se ser «parceiro» da Uber não basta ter um automóvel, mesmo que se trate de um topo de gama, sendo necessário ter atividade aberta enquanto pessoa coletiva e licença para transporte de passageiros. Assim, a maior parte dos motoristas que prestam serviços de transporte através da Uber acabam por fazê-lo através de uma operadora turística ou de um rent-a-car. No caso de André, o processo foi relativamente simples: a recomendação de um amigo levou a que bastasse apenas a apresentação do cadastro e a posse de carta de condução. Ao final de 48 horas já estava a trabalhar. Afinal, «como as condições não são as melhores há uma rotatividade muito grande e eles estão constantemente a precisar de novos condutores».

Manuel [nome fictício] também se encontrava desempregado quando decidiu responder a um anúncio para motorista publicado no OLX. «Tirei um curso de audiovisuais na Restart mas, pronto, não consegui trabalho na área. Estive desempregado algum tempo a fazer uns trabalhos na [cidade de origem], que é de onde eu sou». À semelhança de André, o recrutamento não foi exigente, não tendo a empresa sequer avaliado o seu nível de condução. Existem outros critérios de seleção, como o domínio de línguas estrangeiras, nomeadamente o inglês, ou a posse de conhecimentos sobre a cidade, «mas não é imperativo». Cedo começou a trabalhar para uma empresa que alugava seis automóveis à Leaseplan, multinacional especializada na gestão e aluguer de frotas com a qual a Uber estabeleceu um protocolo o ano passado. Desta forma, as organizações «parceiras» que pretendem ter carros da Uber com motoristas a circular recorrem aos seus serviços.

Durante os dois meses em que trabalhou para a Uber, André cumpriu turnos de 12 horas diárias. «A ideia é ter um carro a andar 24 horas. Para isto eles fazem dois turnos de 12 horas cada. […] Todas as empresas fazem isto. Turnos de 12 horas, uma folga por semana. No meu caso, e isto é o que muda de empresa para empresa, eu trabalhava das 7 da tarde às 7 da manhã, e depois outro pegava das 7 da manhã e fazia até às 7 da tarde». Por isto, recebeu à volta de 800 euros, a recibos-verdes (regime de trabalho independente), não se incluindo neste valor os descontos a realizar para a Segurança Social. Apesar disso, segundo relata, veio a perceber que, ainda assim, as suas condições eram um pouco melhores do que as auferidas pela grande maioria dos motoristas Uber. Além do telemóvel, era-lhe dado um cartão da empresa para gasolina, com um limite baseado numa estimativa das viagens realizadas e em procura de clientes.

O valor do rendimento auferido, destaca, prende-se com o facto de ter trabalho durante uma época alta (novembro e dezembro). Os preços das viagens são definidos por um tipo de tarifa dinâmica, podendo estes aumentar em momentos de «pico»: «Dependendo de haver poucos carros da Uber ali e haver muita procura, os preços vão subir de facto e quando sobem são muitíssimo mais caros do que os táxis». Em todos os casos, a taxa cobrada pela Uber é de 25%: «Depois havia uma percentagem para a operadora para a qual eu trabalhava e eu ficava com 30% do que era cobrado depois da Uber ter tirado a sua margem […] Tiramos os 25 % […] e transformamos os outros 75% agora em 100%. Destes 100%, 30% são para mim e o resto é para operadora».

Ao início, as condições enfrentadas por Manuel eram um tanto ou quanto semelhantes. Por um turno de 8 horas diárias, das 11 da noite às 7 da manhã, recebia entre 600 a 700 euros por mês, «mas nunca passou disso e a tendência foi para descer até ao final do Verão». Como se encontrava a terminar o ensino secundário, «o tempo que sobrava era para dormir e tentar comer qualquer coisa de jeito». O pagamento ocorria perante a entrega de recibo-verde à empresa detentora da frota, após a transferência realizada pela Uber (já com o desconto de 25%), correspondendo a 40% do total faturado na semana anterior. Numa fase posterior, a empresa para a qual trabalhava sugeriu-lhe um contrato de subaluguer de automóvel: «Como o trabalho de gerir os motoristas era bastante em relação àquilo que ele estava a ganhar decidiu pegar em alguns motoristas e perguntar se queriam subalugar o carro, ou seja, pagar-lhe a ele uma semanada». Decidiu aceitar a proposta, pagando 250 euros semanais pelo automóvel (mais os custos ao nível dos combustíveis), montante que começou por dividir com um colega. O vencimento é pago exatamente da mesma forma, correspondendo à subtração do valor do aluguer semanal ao total faturado. De início, conforme o seu relato, a mudança terá sido benéfica, conseguindo ultrapassar o rendimento anteriormente obtido. «O problema é que foi exatamente na altura em que começou a haver menos pedidos […]. No último mês estava a tirar nem 100 euros por semana para mim». Tal obrigou a que passasse a trabalhar 12 horas não consecutivas.

Após um interregno de cerca de três meses, devido a mudança de casa, retomou recentemente o trabalho de motorista, pagando o aluguer de automóvel por inteiro a outra empresa pela mesma quantia de 250 euros semanais. Atualmente, tenta conduzir menos horas e de forma alternada. Contudo, se a noite de fim de ano foi rentável – «em seis horas, fiz 150-160 euros» – a posterior diminuição do número de viagens originou uma diminuição dos rendimentos. O resultado de uma semana de trabalho chegou mesmo a limitar-se aos 60 euros. Pensa, por isso, aumentar o número de horas ao volante: «Todas as semanas tenho que ganhar o suficiente para faturar o carro e a gasolina e idealmente qualquer coisa para mim porque está-me a sair do corpo esse trabalho».

«A Uber está-se nas tintas»: um novo modelo de avaliação

Ambos os entrevistados salientam a inexistência de uma vigilância apertada sobre o trabalho realizado. Esta postura, segundo André, deve-se essencialmente a dois motivos: em primeiro lugar, «Eles davam alguma liberdade porque depois também sabem que as pessoas não ficam lá muito tempo», evitando-se assim uma atitude de hostilidade face a uma relação, por si só, já hostil o suficiente; em segundo, «eles têm acesso ao local exato onde tu estás e onde o carro está a cada momento e sabem se estás a viajar ou se não estás a viajar». As informações chegam mesmo a incluir a medição da condução por giroscópio, conseguindo-se «perceber se fizeste acelerações bruscas, travagens bruscas, ele sabe se tu excedes os limites de velocidade e tudo mais. E isto depois recebes um relatório – imagino que a empresa também receba – com as características da tua condução […]. Aparece-te como notificação no teu telemóvel».

Este modelo de gestão, aparentemente menos rigoroso, decorre da própria natureza da prestação do trabalho. A concessão de uma certa autonomia (ao nível, por exemplo, do cumprimento de horários ou das zonas percorridas) surge, neste sentido, diretamente associado ao cálculo do rendimento a auferir pelo motorista, dependente do valor total faturado. Por conseguinte, como relata Manuel, «Eu tinha liberdade total só que quantas mais horas estiver online mais hipóteses há de caírem viagens. Portanto, a ideia é sempre tentar rentabilizar ao máximo».

Mesmo a avaliação do desempenho acaba por ser delegada aos clientes, por sua vez igualmente avaliados pelos motoristas. Se, por um lado, como defende André, «A Uber está-se nas tintas, a Uber dá liberdade total se tu só quiseres estar uma hora a trabalhar», por outro, «impõe outras limitações. Não me chegou a acontecer, mas vi pessoas que sofreram com isso. […] Tu sabes que ao final de cada viagem o passageiro pode dar-te uma pontuação». Duas ou três classificações muito baixas implicam a suspensão da conta, o que «quer dizer que não podes trabalhar. Ninguém te vai chamar porque tu não estás online. E eu vi pessoas a quem isso aconteceu e eles não perceberam exatamente porque é que isso aconteceu […] Eles não chamam despedimento mas simplesmente não tens plataforma, portanto não podes trabalhar».

Esquemas

A logística do trabalho de motorista tende a limitar a comunicação entre colegas. Além de se encontrarem em competição uns com os outros, não existe sequer a partilha de um local fixo, como as praças de táxis. Tal não significa, contudo, o total isolamento ou a total passividade. Além do encontro nas bombas de gasolina, como a do Aeroporto de Lisboa, os motoristas de uma mesma empresa parceira encontram-se ligados pela aplicação Slack, onde trocam conselhos e dicas sobre zonas em «pico». Alguns motoristas – os que conduzem carros elétricos, por exemplo – chegam mesmo a desenvolver canais de comunicação à margem da empresa por via do WhatsApp.

Estes momentos de diálogo são essenciais à divulgação de meios de fuga ao controlo da Uber e da consequente obtenção de maior rendimento. A mais praticada é a «viagem por fora», em que a aplicação é desligada e o condutor negoceia um valor diretamente com o cliente, não recebendo a Uber qualquer comissão. Muitas vezes, como refere André, o esquema é autorizado pela empresa parceira: «como a atividade principal era transfers, aquilo era considerado um transfer. Eu tinha que comunicar o que é que ia fazer e eles haviam de me dar o preço. Para além de tudo isto, ainda podia tentar eu próprio combinar o preço com o passageiro e fazer fora do circuito. Nunca o cheguei a fazer, até porque a empresa depois controla os teus movimentos […] através de um sistema GPS que tem no carro e a que eles têm acesso». Manuel chegou a recorrer a este esquema, cuja prática está longe de ser fora do comum: «Uma grande parte dos motoristas faz mais por fora do que pela aplicação». Em geral, como explica, ela surge associado ao «preço de turista que rende muito mais às vezes. Ainda não me calhou nenhum desses, mas malta que quer ir ao Porto e voltar e então pagam 100, 200 euros e às vezes até bem mais para o motorista ficar com eles».

Uma terceira forma passa por entrar em contacto com o passageiro e perguntar pelo destino: «Se o destino for perto, eles dizem que sim, fazem o tempo de espera para ser cobrada a taxa de cancelamento e não vão». Embora já o tenha feito, refere que se tratou essencialmente de uma defesa, uma vez que «a Uber nunca se responsabiliza se eu fizer 30 km e for buscar um passageiro e ele cancelar. Só recebo a taxa de cancelamento que não paga esses 30 km obviamente. Depois disso ter acontecido uma vez, eu nesses casos, se cair uma viagem tão longe, telefono a saber qual é o destino para saber se me compensa».

Conclusões provisórias

Uma primeira reação aos depoimentos aqui apresentados poderá passar por admitir que nada disto é novo. Ganhar à peça (neste caso por viagem realizada) corresponde a uma das formas contratuais que melhor representa o modo de produção capitalista. No entanto, identificar uma mesma lógica de funcionamento não significa que nada tenha mudado e que, nesta senda, as respostas políticas de sempre devem continuar a ser adotadas.

A emergência deste tipo de empresas de plataformas digitais, quer de transportes de passageiros, quer de outro de tipo de serviços, vem aprofundar uma lógica de produção em rede. Nesta, como foi possível comprovar pelas entrevistas realizadas, um indivíduo acaba por estabelecer relação não com uma unidade económica, mas com uma série delas: a Uber, a entidade parceira ou ainda a empresa de leasing automóvel. O próprio motorista é encarado como uma microempresa que desenvolve um serviço em colaboração com outras suas congéneres. A Uber não é, de facto, uma empresa como as outras, não possuindo infraestruturas materiais ou instrumentos de trabalho, nem um aparelho de gestão e avaliação dos seus trabalhadores, funções essas delegadas tanto nos próprios motoristas, responsáveis por se gerirem a si próprios, como nos clientes, convidados a avaliar o serviço prestado.

Existem, no entanto, alguns elementos a assinalar a existência de uma relação de trabalho. A taxa de 25% cobrada pela Uber é ilustrativa de um processo de produção de mais-valia que envolve trabalhadores de diversas empresas e que, ao contrário do que possa parecer, tem como produto mais do que uma mercadoria. A figuração dos trabalhadores como empresários, já rejeitada por um tribunal britânico 2, prende-se assim com a drástica diminuição de custos. Ao mesmo tempo, a correspondência direta entre produção realizada e salário, a avaliação realizada pelos clientes e a capacidade de vigilância proporcionada pelas tecnologias digitais tendem a garantir níveis de produtividade elevados, com horários a ultrapassar as 8 horas diárias. A par da viagem em si, o resultado da interação entre condutores e técnicos de informática, entre outros trabalhadores, inclui igualmente a produção de informação. Embora esta sirva essencialmente objetivos internos, essenciais à otimização da sua atividade (a identificação dos percursos mais rápidos através da monitorização das viagens ou dos destinos), nada impede que esta possa ser comercializada a empresas de publicidade ou mesmo a organismos oficiais 3.

Por fim, importa referir que os esquemas praticados por alguns condutores pouco diferem de outro tipo de práticas de resistência oculta, como roubos ou a redução dos ritmos de produção, realizadas por camponeses ou operários fabris 4. Embora não se encontrem necessariamente orientados por um projeto político, tais atos são expressão de um conflito de interesses entre quem quer mais dinheiro por menos tempo de trabalho e quem exige mais tempo de trabalho por menos dinheiro. Ainda que traduzindo um poder dos fracos, a sua existência pode significar o início de algo, a avaliar pelas diversas greves de trabalhadores de plataformas verificadas no Reino Unido, nos Estados Unidos ou no Brasil.
André acabou por deixar o trabalho de motorista, tendo arranjado emprego num call-centre «que não é muito melhor, mas ganhava um ordenado base com prémio de 600 euros, que era mais ou menos aquilo que eu estimava na Uber, sendo que trabalhava 6 horas e não trabalhava aos fins de semana […] Não tive questão nenhuma, foi óbvio». Manuel continua a conduzir para a Uber, uma atividade que afirma apreciar: «Primeiro gosto de conduzir, gosto de andar por aí sem saber bem qual o destino». Contudo, só a vai fazer «o suficiente para aquele que é o meu objetivo agora: juntar algum dinheiro para alugar um espaço e montar uma pequena carpintaria e fazer disso o meu rendimento […] É mais tranquilo».

Texto por ZNM
Ilustração por Catarina Leal

Notes:

  1. (1) Sara Otto Coelho, «Excesso de horas, precariedade, baixos salários. A vida dos motoristas da Uber». Observador, 2 de janeiro de 2017. Disponível aqui.
  2. (2) A decisão do tribunal de trabalho determinou que a Uber não poderia continuar a tratar os condutores como trabalhadores independentes, o que implica o pagamento, pelo menos, de um salário mínimo, de subsídios de férias e a organização do trabalho por turnos. A empresa perdeu recentemente o recurso judicial que então havia apresentado como forma de contestação desta decisão.
  3. (3) Nick Srnicek, Plaform Capitalism, Cambridge, polity, 2017, p. 84.
  4. (4) Ver James C. Scott, Dominação e Artes da Resistência: Discursos Ocultos, Lisboa, Letra Livre, 2013.

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3 Comentários
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  1. Boa noite
    Fiz um financiamento de carro no meu nome para meu filho trabalhar por conta propria com a uber
    Abri uma empresa com o meu filho eu como socia e ele como gerente ,ele esta com todos os documentos exigidos pela uber prontos
    mas nao consegue comecar a trabalhar porque o financiamento do carro esta no meu nome e ele nao tem credito
    o que fazer?
    obrigada

  2. Queria travalhar na Uber ou noutras firmas tenho a licença tve

  3. Olá,

    sem dúvida que este tema das plataformas electrónicas de mobilidade merece atenção. Contudo o artigo parece-me um pouco aquém do que poderia ser.

    Há neste momento (Outubro de 2018) principalmente quatro plataformas electrónicas de intermediação, acessíveis ao cidadão comum, sendo elas a Uber, a Cabify, a Taxify, e a Chauffeur Privé (ChP). Todas elas funcionam nos mesmos moldes em traços gerais. Depois há outras dedicadas apenas às empresas (Taksee, por exemplo).

    Com estas plataformas electrónicas é possível estabelecer-se uma relação directa, o chamado parceiro. O parceiro podia ser um Empresário em Nome Individual (ENI) até Março de 2017, altura em que a Uber (na altura não havia Taxify nem ChP) deixou de aceitar essa tipologia, dado que a lei que estava a ser discutida por uma comissão parlamentar também o impedia.
    O parceiro pode ser o chamado parceiro-motorista, caso em que geralmente é alguém que conduz o seu próprio carro, ganhando 75% do valor da viagem no caso da Uber, 85% do valor da viagem no caso da Taxify e ChP. Pode igualmente o parceiro ser uma micro-empresa com três ou quatro carros ou uma grande empresa com frotas de 100 ou 200 carros. Neste dois casos, surge então a figura de motorista de parceiro, que são os dois casos retratados no artigo.

    A situação de motorista de parceiro é a mais delicada e frágil desta engrenagem. Baixos rendimentos e precariedade laboral, e essa será a situação mais comum. Há contudo parceiros que pagam mais do que o que referido no artigo, por exemplo 50%. Há também parceiros que fazem contratos de trabalho com os motoristas, algo que com a lei que entra em vigor a 1 de Novembro de 2018 passará a ser obrigatório (assim funcione a inspecção da ACT).

    O sistema torna-se injusto por diferentes motivos: a Uber (e restantes plataformas) não estão muito preocupadas com os parceiros nem com os motoristas. Desejam receber a sua comissão e pouco mais. Verificam os requisitos de acesso à actividade, que inclui o registo criminal actualizado a cada três meses e o averbamento grupo 2, três seguros obrigatórios e específicos (dois da actividade e um do automóvel com protecção de ocupantes), a idade e segmento do veículo. Não parecem as plataformas demasiado preocupadas com o viabilidade económica da actividade dos parceiros, pois uma queixa comum que se ouve nos diferentes grupos de whatsapp e facebook é existirem demasiados carros em operação.
    Os parceiros também são fonte de injustiça na medida em que desconhecem ou rejeitam qualquer forma de cooperativismo, “contratando” motoristas à comissão e não os integrando na estrutura da empresa. Haverá os que são mais honestos e os que são mais exploradores, como em tudo.
    Os motoristas pecam igualmente pela incapacidade organizativa. Protestam muito nas redes sociais mas são incapazes de se organizarem para conquistarem melhores condições, ao contrário do que acontece em Espanha ou França, onde existem associações representativas e activas.

    A solução pode passar por a lei permitir a actividade apenas a cooperativas (mais de um carro) e empresários em nome individual (um carro), ou pela criação de uma plataforma electrónica portuguesa, mais escrutinada e com menos apetites capitalistas, talvez com capital maioritariamente público.
    De referir que a possibilidade que é conferida a qualquer pessoa de chamar facilmente um carro através do telemóvel veio para ficar. É fundamental que esteja bem regulada, de forma a que seja uma mais valia para a mobilidade urbana e uma forma mais eficiente de gestão dos recursos do que aquela fornecida pelo tradicional sector do táxi, nomeadamente através da possibilidade da partilha em simultâneo de um veículo por mais do que um utilizador, de forma a dividir a pegada ecológica da viagem e a maximizar o uso dos recursos envolvidos.

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