A pacificação do movimento e os travões à continuação
De Paris-Luttes.Info
Tradução Mário Rui
Distinguir o activismo pacifista da pacificação do movimento.
Porquê pensar e afirmar que o “pacifismo” assumido do comício quotidiano da “Nuit Debout” na Place de la République é precisamente o que poderá prejudicá-lo, quando se é um militante pacifista?
Porque uma grande parte das pessoas ditas “pacíficas” naquela praça não são “militantes pacifistas”. A maioria não tem nada a ver com o combate antimilitarista e não fazem nada contra as guerras, o imperialismo e o colonialismo. Aliás, dizem que é preciso combater o “DAESH”, como se o EI (Estado Islâmico) fosse um monstro extraterrestre que não tivesse origem nos negócios industriais dos fabricantes de armas que lucram com as guerras ocidentais, das quais é preciso lembrar que a França é um dos maiores fornecedores. O inimigo externo é assim também o inimigo aqui criado. Um militante pacifista pela Paz é legítimo nas suas acções quando estas visam destruir os bens materiais que são o símbolo das violências da guerra, as mais mortíferas do capitalismo. Destruir uma espingarda, antiga imagem ícone dos resistentes à guerra, é um acto pacifista. Destruir os multibancos, as montras das agências imobiliárias ou arrancar os painéis publicitários da JC Décaux, que aliás não se importa de divulgar as campanhas de recrutamento do exército ou da polícia, também são actos pacifistas, atitudes de autodefesa que vão no sentido da Paz social e mundial. Os ajuntamentos ditos “pacíficos” distinguem-se do pacifismo na medida em que são a pacificação e a via para o adormecimento de um movimento que tem pela frente uma realidade social das mais duras, em pleno estado de emergência, consequência directa dos bombardeamentos imperialistas do exército francês no estrangeiro.
Enquanto estivermos todos sentados numa praça a discutir um filme sobre a violência patronal ou policial, a votar utopias imaginárias (que às vezes se contradizem) ou a dizer parvoíces dignas de imbecis (alguns mesmo situados à direita) do género “este movimento é apolítico”, então nada mudará e o movimento não conseguirá nunca ter os meios eficazes contra o que combate: a violência do mundo do trabalho e das empresas, e a violência do mundo inteiro que tomou aquela como modelo. Greves, bloqueios e sabotagens são igualmente elementos tangíveis que é necessário ter em conta para lutar. Um movimento social de confrontação com o Poder deve estar preparado para se bater contra a violência do Estado. É preciso estar preparado, apesar de pacifistas, para contrariar esta violência através da sabotagem económica generalizada. E para isto é preciso estar preparado para perturbar a ordem pública e fazer frente às forças da ordem e à empresa. Entretanto, e voltando aos propósitos das “noites em pé pacíficas”, esta pacificação parece mais uma procura de passividade, uma passagem a ferro das rugas, um nivelamento do cardiograma da luta, servindo mais para chamar a atenção da classe média pacificada, instalá-la num conforto que a desresponsabiliza, um pouco como num sofá em frente à televisão. Esta mesma classe irá certamente votar nas próximas eleições, fará sempre a distinção entre os desordeiros e os manifestantes, e evitará sempre o confronto com o poder e as suas violências estatais, aceitando as suas acções por mutismo ou pelo seu papel de espectador. Dizem-se pacíficos, mas acham necessários esses tipos que se passeiam de armas na mão e que se chamam polícias, gendarmes, soldados, etc. e que são os pilares da repressão e os escudos do capitalismo, do Estado e das suas instituições. “Todo a gente detesta a polícia”, certo, mas alguns mais do que outros.
É urgente pensar a violência, sobretudo quando esta vem de um só lado e obriga à autodefesa. É preciso responder-lhe através de acções políticas directas, pacifistas ou não, e recusar a pacificação do movimento pelos ajuntamentos “pacíficos” onde todo a gente está de forma legal, respeitando as autorizações da Prefeitura da Polícia, alcançando apenas um vazio ideológico incapaz de decisões e ineficaz perante a violência policial.
Eis a diferença entre pacifistas e pacíficos. Os primeiros estão prontos para se baterem contra a guerra e o estado de guerra, os segundos, não se sabe muito com o que contar. É uma bonita palavra, “pacífico” e a sua família de derivados, bastante bela para não se esconderem detrás e deixarem andar. Então não sejamos mais papistas que o papa (que abençoa os exércitos), nem mais pacificador que um pacifista. Mesmo Casimir (?) teria sido desordeiro!