«Portugal: A Revolução Impossível?»
É o título do livro de Phil Mailer, recentemente editado, e que todos aqueles que queiram saber sobre o 25 de Abril de 1974 devem ler. Isto porque o livro, escrito em forma de diário, acompanhando os acontecimentos até ao 25 de Novembro de 1975, elucida bem o leitor sobre as movimentações das classes trabalhadoras, bem como as da classe política e militar, durante esse período crucial. Podemos ver os contrastes, as diferenças de métodos, objectivos e sonhos, os interesses em jogo, a alienação ideológica das inúmeras organizações ditas revolucionárias. E substituir, no fim da leitura, o ponto de interrogação existente no título por um de exclamação. Isso, claro, se procurámos encontrar, pese os abalos profundos que existiram, uma revolução social emancipadora, que não existiu, no Portugal de 1974/75.
Phil Mailer descreve muitos desses abalos, os momentos altos, onde os assalariados se esforçaram por levar à prática a gestão directa sem intermediários, tornando-se, esse esforço, durante um curto espaço de tempo, em tomada de consciência do papel a desempenhar pelos despossuídos. Muito diferente dos enredos ideológicos e disputas entre partidos cuja ideia fixa é a conquista do poder de Estado. Houve dezenas de organizações revolucionárias, todas leninistas, portanto, conservadoras e contrárias à autonomia das classes trabalhadoras.
Phil também não esqueceu o ataque de que foram vitimas as mulheres do MLM (Movimento de Libertação das Mulheres) durante um comício que promoveram no início de 1975, «desencadeando uma das contramanifestações mais reaccionárias jamais vistas». O PCP, através do MDM (Movimento Democrático de Mulheres), que controlava, «denunciou violentamente a manifestação». As mulheres, uma dezena, foram alvo de troça, insultadas e por pouco não foram agredidas. O MLM queria «queimar objectos que sejam exemplos da opressão a que estamos sujeitas: o código civil, o código penal, a legislação do trabalho em vigor, por neles ser bem evidente a opressão feminina; revistas pornográficas», todos os objectos «que simbolizam a mulher escrava do lar.» Era demasiado radical, mesmo para a esquerda que estava mais vocacionada em «defender a família do que em discutir problemas mais básicos das mulheres».
Não resisto a transcrever o último parágrafo deste livro: «Verificou-se que os revolucionários – na sua grande maioria – eram parte do problema e não parte da solução. Neste sentido, a experiência portuguesa pode revelar-se uma prefiguração das revoluções futuras. As lições devem ser ponderadas enquanto há tempo. A alternativa é clara. Foi expressa há muitos anos: «A libertação dos trabalhadores é obra dos próprios trabalhadores».
Portugal: A Revolução Impossível? foi editado em Portugal pela editora Afrontamento em 1978, uma versão resumida do original, publicado em 1977 pelas edições Solidarity (Reino Unido), com co-edições da Free Life Editions (Nova Iorque) e da Black Rose (Canadá). É o primeiro livro sobre o 25 de Abril editado pela Antígona, isto é, se não tivermos em conta A Declaração de Guerra às Forças Armadas de Custódio Losa.
Portugal: A Revolução Impossível?
Phil Mailer
Antígona, 2018
400 págs.
Texto de J.T.