Black Seed, uma publicação anarquista verde
Passados seis anos desde a última edição da revista Green Anarchy, alguns dos seus colaboradores, e outros interessados na crítica anti-civilização, decidiram lançar em 2014 um novo projecto editorial. O objectivo era «reintroduzir essa provocação anarquista verde», mas com uma orientação diferente. Em vez de assentarem teoria e prática numa perspectiva abstrata sobre a civilização, sustentada por análises académicas da história e da antropologia, e romantizando as culturas primitivas, o ponto de partida seriam as suas próprias experiências. A Black Seed distancia-se de outros projectos editoriais assumidamente «anarco-primitivistas», ao incorporar no seu discurso a rejeição de qualquer ideologia, assumindo no entanto que as tradições nativas se relacionam com o seu projecto.
Actualmente, esta publicação bianual em formato de jornal conta com 5 edições, e as 32 páginas que compõem cada número trazem textos, notícias, ilustrações e poesia, que fazem valer não só uma crítica ao estado e ao capital, como procuram outras compreensões focadas na terra, e naquilo que fica fora do processo de humanização. Daqui a publicação de textos que continuam a demonstrar a inocuidade dos movimentos identificados com a «esquerda», tanto pelo óbvio falhanço histórico, como pela falta de questionamento relativamente à tecnologia, organização, moralidade, progresso, autoridade e alienação. Esta demarcação ocorre também em relação a outras tendências dentro do universo anarquista, em particular aquelas que se fundamentam numa visão do mundo exclusivamente centrada no humano.
A crítica aos movimentos ambientalistas está igualmente presente nas páginas da Black Seed, entre outras razões, pela sua postura paternalista por «salvar o planeta». Isto ao mesmo tempo que é assumido o suporte e inspiração em experiências concretas de eco-resistência, como por exemplo a luta do povo Mi’kmaq contra o fracking, as ocupações da ZAD 1contra o aeroporto e a sociedade que este promove, as acções da ELF (Frente de Libertação da Terra), ou o movimento NO TAV 2.
Entre outros temas de interesse que vão surgindo pela mão de diferentes autores, destaca-se ainda a denúncia do cientificismo, que, desprezando e sobrepondo-se a outras fontes de conhecimento, tem servido o sistema tecno-industrial e os seus propósitos de controlo e domesticação. Desta perspectiva, considerando o conhecimento e a vivência dos povos indígenas, e daqueles que estão mais ligados à terra, entende-se a razão porque são publicados esporadicamente, em forma de poemas, ou histórias pessoais, conteúdos que se aproximam de uma espiritualidade contemplativa, livre de superstições e conceitos religiosos.
Numa época em que boa parte do diálogo anarquista acontece na internet, os editores da Black Seed preferem a edição em papel, como forma de desacelerar e refletir, desafiando esse imediatismo digital, de maneira a aprofundar o debate de ideias. Apesar disso, é possível encontrar os números mais antigos no acervo virtual The anarchist Library 3.
Texto de Artur Flores
Notes:
- Zone à Défendre, em Notre-Dame-des-Landes (França). ↩
- Referente ao movimento popular surgido no Vale de Susa, em Itália, contra a construção de uma linha de comboio de alta velocidade. ↩
- theanarchistlibrary.org ↩